Afinal, a pandemia da Covid-19 se traduzirá em uma única e grande onda ou vai acontecer em várias ondas de contágio, com o ressurgimento de novos casos depois de uma maré baixa?
Até que a vacina surja como resolução definitiva, coisa que só é esperada a partir de 2021 e se os testes se mostrarem eficazes, espera-se que novos casos da doença continuem reaparecendo em países que supostamente haviam erradicado a enfermidade.
Nesta terça-feira (28), Margaret Harris, porta-voz da OMS (Organização Mundial da Saúde), descreveu a pandemia do novo coronavírus como “uma grande onda” e fez um alerta contra a complacência em relação à transmissão do vírus durante o verão no hemisfério Norte. “Nós estamos na primeira onda, e vai ser uma grande onda. Ela vai subir e descer. A melhor coisa a se fazer é achatá-la e transformá-la numa marolinha aos seus pés”, afirmou Margaret.
Mas não há consenso entre os especialistas até o momento, nem mesmo entre as autoridades da OMS, sobre a definição de “ondas”, uma vez que elas são caracterizadas por uma reincidência total da doença após um período zerado de novos casos da doença.
Nas últimas semanas, o reaparecimento da doença em alguns países, provocando novos recordes diários, como Hong Kong (que atingiu o pico de 145 novos casos no último dia 27 de julho, após o mês de junho praticamente inteiro abaixo de 30 casos diários), e Japão (que registrou 927 novos casos no dia 24 de julho, com crescimento da curva a partir do dia 22 de junho), podem indicar que a epidemia nunca se erradicou, apenas regrediu.
Outros países também apresentaram uma curva ascendente após semanas de estagnação. O caso mais chamativo é o da Espanha, que registrou 6.361 novos casos no último dia 27.
A alta fez com que o governo voltasse às medidas de restrição nos bares e restaurantes, limitasse o acesso a praias no litoral de Barcelona e decretasse obrigatório o uso de máscaras. No dia anterior, o Reino Unido decretou a quarentena forçada para qualquer viajante vindo do país ibérico.
Na França, a média móvel de casos diários cresceu 200% nas últimas semanas, e o país deixou para trás os dias em que nenhum novo caso do novo coronavírus era reportado. O governo também passou a exigir obrigatoriedade de exames de cidadãos de dezesseis países, incluindo os Estados Unidos e o Brasil, em uma tentativa de impedir a entrada de novos portadores do vírus.
Paulo Lotufo, epidemiologista e professor titular de clínica médica da Faculdade de Medicina da USP, explica a diferença entre ondas e surtos.
“Surto é surgimento de uma enfermidade localizada que não atinge todo mundo, como por exemplo piolhos em uma escola. A epidemia é quando passa do número normal daquela época do ano para uma determinada doença ou quando ela é muito nova [como é o caso da Covid-19]”, afirma o epidemiologista.
Para ele, a impressão no caso da Covid-19 é de uma única grande onda mesmo. Lotufo afirma que a pandemia pode vir em ondas distintas, mas é preciso ter certeza que o país zerou o contágio para ter essa confirmação.
“Em Barcelona, a impressão é que não houve o fim do contágio. Já na Itália, embora a taxa de mortalidade tenha sido a mais elevada do mundo na região da Lombardia, a taxa de contágio se manteve baixa.”
Segundo o epidemiologista, no casos dos Estados Unidos nota-se uma taxa elevada de novos contágios em Nova York, no inverno, e agora número de casos diários elevados em estados como Flórida e Texas, em pleno verão americano. “Mesmo assim, não podemos falar de primeira e segunda onda no continente americano, pois essa definição só se aplica quando há erradicação completa da doença.”
Para Lotufo, o padrão de sazonalidade típico de outros vírus como o da gripe não é observado para a Covid-19. “O padrão típico de Influenza tem os primeiros casos no começo do inverno, atinge um pico no meio da estação e depois cai.”
Na pandemia de Covid-19, os novos casos reportados diariamente podem indicar apenas surtos locais, provocados quando em uma parcela específica da população –por exemplo, frequentadores de casas noturnas ou templos religiosos– são registrados diversos casos com uma origem mútua.
Para fins de comparação, a gripe de 1918 (H1N1), conhecida mundialmente como gripe espanhola (batizada assim pois a imprensa ibérica noticiou intensivamente a pandemia), teve duas ondas bem demarcadas muito bem caracterizadas temporalmente.
Com cerca de 500 milhões de pessoas contaminadas em todo o mundo e mais de 50 milhões de mortes, a origem da paciente zero ainda é debatida, mas o primeiro caso foi registrado nos Estados Unidos em março.
No país norte-americano, a doença se espalhou principalmente nos soldados que combatiam a Primeira Guerra Mundial. Com isso, se alastrou para o continente europeu.
Uma segunda onda da epidemia surgiu nos Estados Unidos entre setembro e novembro, ocasionando 195 mil mortes apenas em outubro. A terceira onda da doença no país veio em janeiro de 1919, com 1.800 casos novos em São Francisco e 100 novas mortes apenas nos primeiros cinco dias do ano. A doença só foi totalmente erradicada no verão de 1919.
“Espero que não tenhamos que esperar um ou dois anos para descobrir se há sazonalidade para o coronavírus. Espero que até lá a gente tenha a vacina e a história não seja contada”, diz.
As informações são da FolhaPress
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