O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no mês passado, que o poder público pode determinar se templos religiosos fecham ou não durante o período de isolamento social trazido pela pandemia da covid-19. A decisão implica que os estados e municípios têm autoridade e autonomia para decidir se devem fechar templos religiosos durante a crise. O resultado traz polêmicas entre religiosos e até políticos.
A repercussão foi grande entre cultistas de diferentes matrizes religiosas, como Jairo Neto, de 28 anos, que trabalha no departamento de comunicação da Primeira Igreja Batista do Cruzeiro. As celebrações virtuais estão disponíveis no Youtube.
Ele relata que os pastores receberam a notícia da decisão do STF com tristeza, afinal os raros momentos de confraternização presencial que haviam com os fiéis foram cessados.
A medida significa que estados e municípios terão o poder de fechar os cultos e templos, diferente da decisão anterior e individual do Ministro Nunes Marques, que permitira o funcionamento, desde que com protocolos de segurança e 25% da capacidade
Mesmo sem poder ir ao culto presencialmente, Jairo comenta que os fiéis não deixaram de ofertar o dízimo, o que não só manteve a igreja financeiramente como possibilitou a reforma do templo, mas que impediu o uso da estrutura para os cultos, que estavam sendo realizados do lado de fora da igreja até a decisão do STF.
Aconteceram também missas online, tanto por canais de streaming quanto por chamadas de vídeo com os fiéis, porém essas alternativas não são tão bem vistas pelos pastores. De acordo com Jairo, as incertezas sobre como o dízimo seria arrecadado colaboraram para essa visão.
Apesar das medidas que podem substituir os cultos presenciais, ainda existe uma grande divisão de opiniões dentro da igreja. Os pastores, por exemplo, são contra esse novo fechamento, diferente das irmãs que trabalham no departamento infantil, que estão preocupadas com a segurança das crianças.
Jairo, que é a favor da reabertura, também diz que a perda de fiéis para a Covid assustou o templo e causou essa divisão de pensamentos, tanto na própria igreja batista do Cruzeiro quanto dentro das assembleias.
“Narrativas estão politizadas”
E a insatisfação por conta das medidas adotadas pelo STF parece estar em outros lugares, ao menos é o que diz em entrevista o pastor da Assembleia de Deus do Jardim Botânico Claudinei Benedicto, de 49 anos. “A nossa expectativa é que tudo se normalize e não tenha mais necessidade de se prorrogar tais medidas, pois essas narrativas já estão politizadas, e o povo não aceita mais tais medidas, todos em busca da liberdade”, comenta o pastor.
Quando perguntado sobre como foi a reação dele e das pessoas que têm contato ao receber a notícia da decisão do STF, o pastor também demonstra insatisfação na fala e mostra discordar de como as coisas estão sendo feitas. “Com reservas. Já é uma causa essencial e fere o direito de Culto, pois foi direcionado ao nosso público. E equivocadamente não teve o mesmo trato com outros setores como ônibus, metrôs, shoppings”, conclui Claudinei.
“Precisamos proteger a vida”
Na igreja católica, a dualidade de opiniões também foi observada. O padre Paulo Alves, da paróquia Imaculado Coração de Maria situada em Taguatinga Norte, reconheceu que não são apenas as igrejas que estão sofrendo com as limitações da pandemia, mas esperava que após mais de um ano o problema já estivesse sido resolvido. “Não era nosso desejo que isso voltasse a ocorrer, já que esperávamos uma melhora significativa após um ano convivendo com esse vírus, mas precisamos proteger a vida, porém sem deixar de lado a fé que nos acompanha em todos os momentos”.
“As celebrações eucarísticas na Igreja católica não são um programa de TV”, diz o padre
O padre, no entanto, considera que a prática religiosa é uma experiência de fé e também comunitária, e que só se viabiliza presencialmente. “Não se faz essa experiência a distância, não é uma fé individualista. Em toda história da Igreja, mesmo atravessando diversas pestes e perseguições sempre se manteve com as portas abertas e com as celebrações”, desabafou.
Ele também mencionou que antes da decisão do STF, a paróquia executava todos os protocolos exigidos como “tapetes sanitizantes na entrada do templo, aferição de temperatura de todos os fiéis, álcool 70º na entrada e antes de receberem a comunhão, uso obrigatório de máscara e distanciamento físico entre aqueles que não fazem parte do mesmo núcleo familiar”, completou.
“Cristo arriscaria a vida dos fiéis?”
O teólogo Raniere Carvalho comentou que a reivindicação da essencialidade dos cultos e missas deve ser relativizada. “Até que ponto Cristo se faria presente de maneira a arriscar a vida daqueles que o seguem?”, questiona.
Ele acrescenta que a questão nunca foi sobre a liberdade do exercício da fé, visto que o livre culto está previsto na constituição, e sim sobre a maneira que se é realizado: a possibilidade de realizar as missas online sanaria o problema do culto presencial neste momento.
Sobre as manifestações políticas contra a decisão organizada por grupos evangélicos, o estudioso diz que a crença na fé da prosperidade, pautada na maior arrecadação gerada pela maior frequência, é o grande motivador dos protestos.
A reabertura total, segundo ele, também significaria maior imposição de influência nas tomadas de decisão governamentais. Apesar dessas motivações, o teólogo confirma que a questão é de cunho sanitário, portanto os cultos devem se adaptar ao momento e tentar ao máximo preservar a vida, independente de interesses religiosos ou políticos.
Sobre as manifestações políticas contra a decisão organizada por grupos evangélicos, o teólogo diz que a crença na fé da prosperidade, pautada na maior arrecadação gerada pela maior frequência, é o grande motivador dos protestos.
A reabertura total também significaria maior imposição de influência nas tomadas de decisão governamentais. Apesar dessas motivações, o teólogo confirma que a questão é de cunho sanitário, portanto os cultos devem se adaptar ao momento e tentar ao máximo preservar a vida, independente de interesses religiosos ou políticos.
Por Luiz Fernando Santos, Mateus Arantes, Renato Queiroz e Vinícius Pinelli
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira
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