Trump retoma comícios com ataques a Joe Biden e sem observar regras de segurança para a Covid-19

WASHINGTON — Menos de duas semanas depois do anúncio de que estava com Covid-19, doença que chegou a deixá-lo internado por três dias, o presidente americano, Donald Trump, realizou um comício na Flórida nesta segunda-feira, estado visto como indispensável para suas pretensões de permanecer por mais quatro anos na Casa Branca. Antes de subir ao palanque, seu médico, Sean Conley, anunciou que os testes realizados no presidente deram negativo, dizendo que ele não transmite mais o vírus para outras pessoas.

Nos últimos dias, o governo vinha se recusando a divulgar os testes — no sábado, quando ocorreu um ato de campanha na Casa Branca, o médico do presidente disse que ele não era mais um risco às outras pessoas, mas sem revelar se os exames ainda mostravam a presença do vírus no corpo de Donald Trump.

Diante de uma multidão usando bonés da campanha e sem muitas máscaras aparentes, Trump atacou o adversário democrata, Joe Biden, questionando sua sanidade mental e afirmando que um voto nele seria o mesmo que “jogar com o país”. Relembrando seus discursos de 2016, disse que “não era um político”, mesmo depois de quase quatro anos no principal cargo eletivo do país.

Em um aceno ao eleitorado latino, afirmou que Joe Biden “é admirador de Fidel Castro”, uma acusação repetida algumas vezes pelo republicano, mesmo sem encontrar respaldo em fatos.

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Quatro viagens em uma semana

O presidente fez elogios à juíza Amy Coney Barrett, indicada por ele à Suprema Corte e que hoje iniciou sua sabatina no Senado. Para ele, é parte de sua promessa de campanha de colocar magistrados conservadores na principal Corte do país. Depois de rejeitar medidas mais duras contra a Covid-19, especialmente os lockdowns, afirmou que a doença o havia deixado “mais forte” e que agora ele “estava imune". Ao final do evento, desceu do palco e falou com algumas pessoas da plateia, muitas sem máscaras. Nos próximos dias, o republicano vai emendar uma sequência de comícios em estados onde a disputa está acirrada, como a Pensilvânia, Iowa e Carolina do Norte.

Horas antes do evento, Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas e um dos principais infectologistas do país, afirmou que realizar esse tipo de evento, em meio à pandemia, é “pedir para arrumar problemas”.

— Vimos que quando temos situações de muitas pessoas aglomeradas, muitas sem máscaras, as informações falam por si. Isso acontece. E agora é um momento muito ruim para se fazer isso, veja o que está acontecendo com os EUA — disse Fauci em entrevista para a CNN.

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Fauci, que participa da força-tarefa da Casa Branca para a Covid-19, também criticou um anúncio veiculado pela campanha de Donald Trump em que o médico parece elogiar a resposta do governo federal à pandemia. Segundo ele, suas falas foram tiradas de contexto.

Batalha pela Flórida

A escolha de Trump por realizar o comício na Flórida mostra como os dois candidatos estão focados em vencer no estado, visto como crucial para as duas campanhas. As pesquisas mostram o democrata Joe Biden com pequena vantagem, entre 4,5 e 3,7 pontos percentuais, segundo médias elaboradas pelos sites Fivethirtyeight e Real Clear Politics.

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Desde 1996, quem vence no estado acaba chegando (ou permanecendo) na Casa Branca, mas a diferença entre o primeiro e o segundo colocado tende a ser pequena. Em 2016, por exemplo, cerca de 117 mil votos separaram Donald Trump de Hillary Clinton. Em 2000, naquela que pode ser chamada de mais icônica eleição no estado, 537 votos deram a vitória a George W. Bush contra Al Gore — e decidiram o vencedor nacional.

“Nas últimas décadas, a Flórida se tornou o mais importante estado nas eleições presidenciais nos EUA”, escreveu o professor de ciência política da Universidade da Flórida Central, Aubrey Jewett, em artigo sobre o papel do estado no processo eleitoral americano, publicado em 2017. “Nós não somos um estado azul ou vermelho (referência às cores dos partidos) — somos um estado roxo”.

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Essa importância se reflete nos gastos em anúncios: segundo o serviço de monitoramento Advertising Analytics, as duas campanhas gastaram, juntas, cerca de US$ 250 milhões em anúncios na TV no estado, um número que pode ser ainda maior até o fim da votação.

Voto latino

Como nas últimas eleições, o voto latino deve ser um dos principais fatores para decidir quem vai levar o estado — nesse caso, a situação está mais embolada do que nas últimas eleições.

Em 2016, Hillary Clinton venceu nessa parcela do eleitorado por 27 pontos percentuais. Já Biden aparece com uma margem menor nas pesquisas, 16 pontos. Nem mesmo em uma área considerada bastião democrata, o condado de Miami-Dade, a vantagem é tão grande, 20 pontos percentuais. Essa é uma região onde os democratas precisam vencer por margem elevada, para não depender de outras áreas, como o norte do estado, tradicionalmente mais propenso a votar em republicanos.

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Essa mudança de tendência pode ser explicada pela própria condução da política externa do governo Trump para a América Latina. A estratégia do enfrentamento com países como Cuba e Venezuela, além do alinhamento a lideranças conservadoras na região, foram bem vistas na comunidade.

Na quinta-feira, data inicialmente prevista para o segundo debate entre os dois candidatos, mas posteriormente cancelado, Biden participa de um programa em que responderá a perguntas de eleitores indecisos da Flórida. O formato é o mesmo que seria usado no duelo com Trump, conhecido como “town hall” e realizado por videoconferência.

Empate em Ohio

Nesta segunda-feira, porém, as atenções do democrata se voltaram para Ohio, mais um estado onde, desde 1964, o vencedor acaba chegando à Casa Branca. Em 2016, Trump obteve uma ampla margem, de quase meio milhão de votos, e uma vitória do ex-vice-presidente era dada como tarefa impossível. Contudo, as pesquisas mais recentes mostram um empate, e ninguém se arrisca a fazer previsões.

Em evento na cidade de Toledo, Biden tentou passar a ideia de que é o candidato que mais olha para os trabalhadores, enquanto Trump, segundo ele, só quer impressionar a elite.

— Eu não meço as pessoas pela sua conta bancária. Eu e vocês medimos as pessoas pela força de seu caráter, sua honestidade e sua coragem.

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