Um dia após o Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp), do Ministério Público Estadual (MP-RJ), processar dois delegados e um agente da Polícia Civil pelo uso de escolas municipais como "base operacional", em setembro de 2019, durante uma operação no conjunto de favelas da Maré, na Zona Norte do Rio, o subsecretário Operacional da pasta, delegado Rodrigo Teixeira de Oliveira, disse que "esse tipo de ação, no fim das contas, não deve prosperar". Segundo Oliveira, a corporação "vai se valer de todos os recursos e métodos disponíveis", inclusive o uso de helicópteros, nas operações policiais.
O MP pede R$ 25 milhões de indenização ao estado pela operação policial e move duas ações: uma por "dano moral coletivo causado à comunidade escolar", e outra por "improbidade administrativa". Neste último procedimento, são citados os delegados Fábio Barucke, ex-subsecretário operacional da pasta; Sérgio Sahione, que à ocasião era chefe da Coordenadoria Operacional de Recursos Especiais (Core); e o piloto da aeronave, o agente Ricardo Herter.
— A Polícia Civil tem cumprido todas as exigências determinadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O fato é: a Polícia Civil está junto com esses policiais que foram denunciados. A gente entende que não há, de forma alguma, como tentar se igualar com o tipo de força que o criminoso impõe contra a polícia. Então, nós vamos nos valer, sim, de todos os recursos e métodos disponíveis. Agora, é obvio, vamos utilizar em acordo com a lei e aquilo que está sendo determinado pelo STF — afirmou Oliveira, na manhã desta quinta-feira, durante uma coletiva de imprensa na Cidade da Polícia, na Zona Norte do Rio.
Em relação aos delegados, o Gaesp também quer que eles sejam impedidos de exercerem cargos ou funções públicas em que atuem como supervisores ou coordenadores, tendo que planejar ou executar ações policiais. Além disso, o órgão pede à Justiça que afaste Herter da função de piloto, e que ele seja impedido de atuar em outro cargo que esteja associado à operações.
— Esse tipo de ação, no fim das contas, não deve prosperar. Ela deverá ter um resultado infrutífero por parte da Justiça — disse o subsecretário, antes de continuar:
— Estamos atuando dentro da lei. Estamos do lado da sociedade e do lado dos policiais. Então, em casos excepcionais, que é o caso, a operação será feita. O que não se pode é negar o direito de defesa do policial ou da população que ali está. Se esse instrumento é necessário (o uso de helicóptero), ele será usado de acordo com o que é previsto.
A "ação por dano moral coletivo" foi ajuizado em conjunto com a 4ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital e pela 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Educação da Capital, na última terça-feira. Já o processo por improbidade administrativa foi ajuizado no dia 3 de janeiro pelo Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública (Gaesp).
No documento, os promotores afirmam que os investigadores foram à Maré tentar prender o traficante Thiago da Silva Folly, o TH, um dos chefe do tráfico de drogas do complexo de favelas. Ainda segundo o relatório, o helicóptero que dava apoio às equipes em terra disparou 480 tiros em uma hora. O bandido não foi preso.
De acordo com o Gaesp, os disparos aconteceram ao lado do Campus II, na comunidade Salsa e Merengue, que engloba sete unidades escolares do município. Segundo o MP, os tiros colocaram "em risco a integridade física de alunos, professores e funcionários, além de criar um ambiente de pânico e terror, causando intenso sofrimento psíquico à comunidade escolar".
O delegado Ronaldo Oliveira, assessor especial do gabinete da Polícia Civil, criticou a decisão do MP:
— De 32 anos de polícia, e 20 na área operacional, eu não conheço um registro feito onde o helicóptero tenha atingido uma vítima inocente (em terra).
Segundo os promotores, ficou constatado que os dois delegados que tinham poder de decisão sobre a atuação e a execução da operação foram Barucke – com dever de supervisão e responsabilidade sobre a regularidade jurídica do planejamento e execução da mesma – e Sahione, responsável pelo planejamento operacional e coordenação das equipes da Core.
Ainda de acordo com o MP, Herter era o responsável por "definir o percurso aéreo e a sua execução no momento da operação, com sobrevoo por cima das escolas e autorização para o uso de tiro embarcado".
Os promotores, na denúncia, dizem que as autoridades decidiram que o helicóptero deveria sobrevoar o complexo de favelas "mesmo sabendo que estariam diante de confronto armado iminente".
"As autoridades com poder de decisão sobre a realização de operações em territórios notoriamente conflagrados têm a responsabilidade legal e constitucional de avaliar os limites, os riscos e o impacto social dessas operações e, com efeito, sopesar se os meios são proporcionais ao fim almejado", afirma o Gaesp na ação.
O texto continua: "A prisão de um criminoso foragido da Justiça, por mais importante que seja, não justifica a violação de inúmeros direitos fundamentais de toda uma comunidade escolar, e em especial das suas crianças mais vulneráveis".
Na ação das promotorias de Defesa da Cidadania da Capital e da Educação da Capital, os investigadores ressaltam que a operação "contrariou princípios e regras da Instrução Normativa da Secretaria de Estado de Segurança Pública", que define, por exemplo, que operações policiais em áreas sensíveis devem prezar pela preservação da vida e pelo respeito à dignidade humana.
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