PORTO PRÍNCIPE — Autoridades do governo interino do Haiti pediram, nesta sexta-feira, que os Estados Unidos enviem soldados para proteger o porto, o aeroporto, reservas de gasolina e outras infraestruturas do país, dois dias após o assassinato do presidente Jovenel Moïse, na madrugada de quarta-feira.
O ministro das eleições Mathias Pierre disse que o país já enfrenta um grande problema com “terroristas urbanos” que podem aproveitar a oportunidade para atacar as principais infraestruturas do país, enquanto a polícia está concentrada na busca pelos responsáveis pelo magnicídio. Um relatório do Unicef (Fundo da ONU para a Infância) publicado há duas semanas estima que existam hoje 95 gangues armadas que controlam grandes territórios da capital, ou cerca de um terço de Porto Príncipe.
Segundo Pierre, o presidente Joe Biden e o secretário de Estado Antony Blinken haviam prometido ajudar o país.
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— O grupo que financiou os mercenários quer criar o caos no país — denunciou. — Atacar as reservas de gás e o aeroporto pode fazer parte do plano.
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Mais cedo, uma porta-voz do Departamento de Estado, Jalina Porter, disse em entrevista a jornalistas que não poderia confirmar o pedido do governo interino. A secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, por sua vez, confirmou que os EUA enviariam funcionários do FBI e do Departamento de Segurança Interna à capital, Porto Príncipe, “assim que possível” para determinar a melhor forma de ajudar o país.
Nos últimos dias, tem crescido o temor de que a agitação nas ruas e a turbulência política após o ataque possam agravar a pior crise no país em anos. Robenson Geffrard, repórter do Le Nouvelliste, um dos principais jornais do país, disse que uma sensação de incerteza e violência pairava sobre a capital nesta sexta-feira.
Mesmo sem legitimidade constitucional, o primeiro-ministro interino Claude Joseph assumiu o país após a morte de Moïse e prometeu manter o calendário eleitoral previsto para setembro. Na quinta-feira, a enviada da ONU no país e o governo americano endossaram o premier e pediram que o pleito seja mantido. Analistas, no entanto, afirmam que realizar eleições justas e seguras em menos de três meses é irreal.
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Constitucionalmente, o sucessor legítimo de Moïse seria o presidente da Suprema Corte, René Sylvestre, que morreu de Covid-19 no fim de junho. Joseph, por sua vez, já deveria ter deixado o cargo, já que o presidente indicou, um dia antes de morrer, Ariel Henry como seu substituto. Henry — o sétimo premier do país em quatro anos — seria empossado apenas no fim desta semana. Ele agora contesta o poder reivindicado por Claude Joseph.
Antes de ser assassinado, o presidente havia remarcado para 26 de setembro as eleições presidenciais e legislativas, que seriam realizadas junto com um polêmico referendo constitucional, que tinha o objetivo de aprovar a elaboração de uma nova Constituição. O segundo turno estava previsto para novembro.
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O Haiti tem um histórico de turbulência e violência política, além de intervenções externas. Os Estados Unidos invadiram o país em 1915, só se retirando em 1943, mas mantendo a influência política. Após quase 30 anos da ditadura da dinastia Duvalier, entre 1957 e 1986, o país elegeu em 1990 o ex-padre católico Jean-Bertrand Aristide, deposto dois anos depois em um golpe militar. Reeleito em 1994 e 2001, Aristide acabou fugindo do país em 2004, em meio a confrontos entre seus apoiadores e ex-militares do Exército que havia sido desmantelado após o fim da ditadura, junto com a força paramilitar dos Duvalier, conhecida como Tonton Macoute.
A fuga deu início à intervenção dos capacetes azuis da ONU, sob comando de forças brasileiras entre 2004 e 2017. A força de paz, que teve vários formatos, permaneceu no país até 2019, sem conseguir estabilizar a situação local, que foi agravada pelo terremoto de 2010, quando mais de 100 mil pessoas morreram. Nos dois últimos anos, a ONU manteve apenas uma missão política no país caribenho.
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